um café envelhecido, preenchido com minúsculas mesas redondas e com minúsculas cadeiras redondas, iluminado com uma luz ténue e cinzenta, criadora de silhuetas esguias a quem observa a contra-luz. um forte aroma a café e o ruído do moínho da máquina expresso sempre a berrar.
atrás do balcão, um homem calvo, de bigode queimado nas pontas, barriga proeminente, ar rigoroso e sério, observa o seu estabelecimento e os seus empregados, tal qual uma ave de rapina cansada. encostado ao balcão, o empregado do café com o tabuleiro redondo debaixo do braço, a mão direita na algibeira a agitar os trocos, um olhar atrevido e um sorriso menos contido, para as meninas que entram e saem do café, e a cabeça, algures, entre as gotículas que formam as nuvens.
na mesa do canto direito, a senhora de cabelo loiro pintado e armado. os lábios rosa escuro, os olhos maquilhados e carregados, a pele brilhante e excedentária, as unhas arranjadas e pintadas de rosa adamascado e indumentária a condizer. olhar septagenário, concentrado no passado, costas curvas, por causa das memórias, e mãos trémulas, por saber o que todos os dias a espera.
a meio da sala, sisudo, grave, austero, de olhar introspectivo e inteligente, observa o fumo do seu cigarro, para se distrair de si próprio, o Sr Dr, que admira os jovens rapazes que entram no café, por detrás das lentes baças dos seus óculos geométricos. cruza e descruza as pernas, sempre que se entusiasma na sua observação. é sempre o último a ir ter com a mulher com quem casou.
terça-feira, abril 15, 2008
quinta-feira, abril 03, 2008
.cús diabos!
petas, petas, petas com gargalhada 1 (do diafragma), gargalhada 2 (da vesícula biliar), gargalhada 3 (do cérebro). depois vem o sorriso 1 (simpático), sorriso 2 (condescendente), sorriso 3 (vê lá se te despachas).
acaba a sessão das petas e ao entrar no café, com o sorriso 1, solto uma gargalhada 2 e peço um bola de berlim.
eu queria uma água.
acaba a sessão das petas e ao entrar no café, com o sorriso 1, solto uma gargalhada 2 e peço um bola de berlim.
eu queria uma água.
terça-feira, abril 01, 2008
.todos os dias
"venha, venha, chegue à frente... não, mais um bocadinho, pode ir para trás...! está bom"
desligo o motor irritada com os faróis secos do ressacado, que observam obsessivamente os meus gestos. estes, a ele ditam se vai amealhar mais uns trocados para o seu pão e água. pão e água esses, que sugam todas suas células e secam o seu espírito de desejo.
tal qual um cão de rua, a rodear um saco de lixo que ficou esquecido há 6 dias no beco mais podre da cidade e que espera por lá encontrar, ao menos um osso, um osso que ainda cheire a carne. aquele mesmo cão que provoca a sensação de repugnância e pena em simultâneo, mas que, inevitavelmente, enxotamos para bem longe.
e assim, eu desejo enxotá-lo para não cheirá-lo, para não olhá-lo, para esquecê-lo... e não dou uns trocados para o seu pão e água. e fujo com medo.
desligo o motor irritada com os faróis secos do ressacado, que observam obsessivamente os meus gestos. estes, a ele ditam se vai amealhar mais uns trocados para o seu pão e água. pão e água esses, que sugam todas suas células e secam o seu espírito de desejo.
tal qual um cão de rua, a rodear um saco de lixo que ficou esquecido há 6 dias no beco mais podre da cidade e que espera por lá encontrar, ao menos um osso, um osso que ainda cheire a carne. aquele mesmo cão que provoca a sensação de repugnância e pena em simultâneo, mas que, inevitavelmente, enxotamos para bem longe.
e assim, eu desejo enxotá-lo para não cheirá-lo, para não olhá-lo, para esquecê-lo... e não dou uns trocados para o seu pão e água. e fujo com medo.
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