Cantava com uma voz límpida os sons do fundo. Dizia que era cego e que só via o que ninguém vê.
Sentava-se todos os dias no largo da aldeia em cima da mesma pedra cantando e fotografando o espírito de cada momento. Os seus amigos, de lá da terra, diziam que ele não foi sempre assim, que já foi como eles, mas alguém o almadiçoou e a partir daí deixou a sua casa, deixou o seu trabalho na lavoura, deixou as suas terras e passou a dormir à porta da igreja. Dizem que assim ele devia sentir-se mais protegido por Deus. Explicaram também, que por ter deixado tudo, Deus o recompensou e tornou-o santo.
-Ninguém no mundo canta como ele e cá na aldeia já ninguém passa sem o seu canto.
Um dia a aldeia não acordou com a alvorada. A pedra do largo estava fria. Sentia-se um calor de trovoada. No céu formavam-se nuvens densas e escuras e, num ápice, descarregaram toda a sua força celeste. Nada restou.
Ouve-se todos os dias um canto límpido dos sons do fundo e vem de uma pedra: "Eu sou um homem cego, mas vejo o que ninguém vê."
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